FOI C0NFIRMAD0: 17 anos após crime Alexandre Nardoni foi s… Ver mais

Na tarde da última segunda-feira, um capítulo inesperado se desenrolou em silêncio nos corredores da Penitenciária II de Tremembé, no interior de São Paulo. Sem alarde, sem discursos, sem câmeras, Alexandre Nardoni — condenado por um dos crimes mais revoltantes da história recente brasileira, o assassinato da própria filha, Isabella Nardoni, de apenas cinco anos — cruzou os portões da prisão.
Era 18h10. Um alvará de soltura selava o momento. O destino? A cidade de São Paulo. O passado? Impossível de apagar.
Nardoni agora está em liberdade. Depois de 16 anos cumprindo pena, parte em regime fechado, depois semiaberto, a Justiça concedeu sua progressão para o regime aberto. Mas a liberdade vem com regras rígidas: ele deve permanecer em casa durante a noite, comprovar trabalho em até 90 dias, comparecer regularmente à Vara de Execuções Criminais, entre outras exigências.
Mesmo assim, a decisão é vista com perplexidade por muitos brasileiros.
Do tribunal ao recomeço: um caminho sob julgamento
Condenado em 2010 a mais de 30 anos de prisão, Alexandre viu sua história — e a da filha — se transformar em símbolo do horror.
A imagem de Isabella, frágil e indefesa, sendo lançada do sexto andar de um prédio na Zona Norte da capital paulista, nunca saiu da memória coletiva. As provas, os depoimentos e a frieza dos envolvidos chocaram o país.
A madrasta da menina, Anna Carolina Jatobá, também foi condenada. Cumpriu parte da pena e já está em liberdade. Agora, os dois dividem novamente o mesmo endereço: a casa do pai de Alexandre, o empresário Antônio Nardoni, no bairro de Santana.
Uma ironia que parece até ficcional, mas é real. Lá, segundo o parecer social que embasou a decisão da Justiça, Alexandre deve também trabalhar — como funcionário na construtora do pai.
“Com a recente perda materna, em liberdade, passará a morar com seu pai, esposa, irmão e filhos”, diz o documento. A narrativa quase beira a normalidade. Mas nada nesse enredo é comum.
Reabilitação ou revitimização?
O advogado de defesa, Roberto Podval, não hesitou em defender a medida. “A decisão é irretocável”, disse. “Se não pensarmos na ideia de reabilitação, a pena terá um efeito perverso.
” Para ele, o tempo cumprido, os estudos realizados dentro do presídio e a boa conduta do réu justificam o direito à progressão.
E de fato, os números ajudam Alexandre: entre estudos e trabalhos realizados durante o cumprimento da pena, ele conseguiu eliminar cerca de 990 dias — o equivalente a quase três anos. Soma-se a isso o tempo mínimo exigido pela Lei de Execução Penal para progressão em casos de crimes hediondos, e o cenário legal permite sua liberdade.
Mas o Ministério Público de São Paulo pensa diferente. Já entrou com recurso para tentar reverter a decisão. Ainda aguarda julgamento. Até lá, Alexandre permanece livre — e sob os olhos atentos de uma sociedade que ainda não esqueceu.
O crime que o Brasil não superou
O caso Isabella não foi apenas mais um no extenso dossiê da violência doméstica brasileira. Ele tocou algo mais profundo.
A brutalidade do crime, a frieza com que foi cometido e a idade da vítima fizeram dele um divisor de águas no debate sobre punição, justiça e impunidade.
Em 29 de março de 2008, a menina Isabella caiu do sexto andar do prédio onde o pai e a madrasta moravam.
A queda, inicialmente tratada como acidental, logo revelou um cenário de violência, manipulação e morte. Segundo a Justiça, Isabella foi agredida antes de ser arremessada pela janela. Uma criança de cinco anos. Lançada por quem deveria protegê-la.
E agora?
Ao sair pela porta principal da penitenciária, Alexandre não voltou ao ponto de partida. Ele entra em um novo território: o da desconfiança pública, da vigilância invisível, da memória coletiva.
Sua imagem, cristalizada nas capas de jornais e nos noticiários, carrega um peso que o tempo talvez nunca dissolva.
Sua presença em liberdade levanta questões inevitáveis: qual o limite do perdão social? A justiça deve ser apenas punitiva, ou também restaurativa? E, acima de tudo, o que acontece com uma nação que vê, atônita, a liberdade concedida a um pai que tirou a vida da filha?
Enquanto Alexandre Nardoni recomeça a vida no anonimato urbano de São Paulo, o Brasil continua tentando digerir uma história que, mesmo 16 anos depois, ainda parece impossível de entender por completo.
Porque certos crimes não terminam quando se fecha a cela. Alguns continuam, silenciosamente, na memória de um país inteiro.