Congresso aprova a dosimetria das penas para condenados no 8/1

A Câmara dos Deputados aprovou, na madrugada desta quarta-feira (10), o Projeto de Lei nº 2.162/23 — conhecido como PL da Dosimetria — que altera o cálculo das penas aplicadas a condenados por crimes relacionados ao 8 de janeiro de 2023. O texto representa uma vitória importante para a oposição bolsonarista, que, após não conseguir avançar com uma proposta de anistia ampla, passou a defender a mudança como alternativa para diminuir o rigor das condenações determinadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
A votação foi apertada: 291 deputados apoiaram a proposta, enquanto 148 votaram contra, e houve uma abstenção. O resultado evidenciou a forte polarização que ainda domina o Congresso.
Mudanças no cálculo das penas
O projeto altera dispositivos do Código Penal e da Lei de Execução Penal, redefinindo regras de dosimetria — o conjunto de critérios usados para determinar a pena final. Entre as principais mudanças está a proibição de somar penas nos crimes contra o Estado Democrático de Direito, como tentativa de golpe de Estado ou abolição violenta da ordem constitucional. Com a nova lógica, em casos relacionados, apenas a punição mais grave deverá prevalecer.
Outra mudança relevante permite a redução de até dois terços da pena para delitos cometidos em “contexto de multidão”, como as invasões ao Congresso, ao STF e ao Palácio do Planalto, desde que o condenado não tenha atuado como líder ou financiador. Para defensores do projeto, essas alterações corrigem supostos excessos nas condenações e tornam o sistema mais equilibrado.
Impacto direto sobre Bolsonaro
Entre os beneficiados está o ex-presidente Jair Bolsonaro, condenado em setembro pela Primeira Turma do STF a 27 anos e três meses de prisão, em regime fechado, por liderar a tentativa de golpe. Com as novas regras, a pena poderia cair drasticamente para cerca de 2 anos e 4 meses, segundo estimativas do relator, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP).
A redução permitiria que Bolsonaro progredisse mais rapidamente para o regime semiaberto e, posteriormente, à liberdade condicional, dependendo de comportamento e de atividades como estudo ou trabalho na prisão. A bancada bolsonarista e aliados do centrão celebraram o resultado, classificando-o como um ato de justiça diante do que consideram perseguição política.
Sessão tensa e acusações de manobra
A votação ocorreu sob clima de forte tensão. A base governista tentou retirar o projeto de pauta e adiar a discussão, sem sucesso. Parlamentares do PT acusaram o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), de ceder à pressão da oposição ao conduzir uma sessão noturna considerada estratégica.
Deputados contrários ao texto, como Glauber Braga (Psol-RJ) e Lindbergh Farias (PT-RJ), protestaram no plenário, chegando a ocupar simbolicamente a mesa da presidência. Críticos afirmam que o PL abre brechas para beneficiar não apenas condenados pelo 8 de janeiro, mas também réus de crimes como lavagem de dinheiro ou participação em organizações criminosas.
Possíveis efeitos e próximos passos
Caso o projeto seja confirmado, centenas de condenados pelos atos golpistas poderão ter as penas significativamente reduzidas, acelerando saídas da prisão ou progressões de regime. O relator defende que o PL não concede anistia, mas sim uma “readequação necessária” para amenizar tensões políticas e promover pacificação.
Movimentos sociais e juristas progressistas, porém, alertam para um possível retrocesso no enfrentamento ao extremismo, afirmando que punições mais brandas enfraquecem o caráter dissuasório da legislação penal em casos de ameaça à democracia.
O projeto agora segue para o Senado Federal, onde a votação deve ocorrer até o fim de 2025. Caso seja aprovado sem mudanças, será enviado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pode sancionar o texto integralmente, vetá-lo parcialmente ou vetá-lo por completo. O Congresso ainda poderia derrubar eventuais vetos.
Em meio à persistente polarização política, o avanço do PL da Dosimetria expõe tanto a divisão interna do governo quanto a estratégia da oposição de reforçar sua narrativa de perseguição. A decisão final deve influenciar não apenas o destino dos condenados, incluindo Bolsonaro, mas também o debate sobre justiça, impunidade e estabilidade institucional no país.





